quinta-feira, 28 de novembro de 2013

ARAUTO DO GRANDE REI

BOLETIM INFORMATIVO DE NOVEMBRO DE 2013

BEM AVENTURADO JOÃO DA PAZ
(1270  -  1340)
Ermitão da Terceira Ordem (1270-1340). Aprovou seu culto Pio IX no dia 10 de setembro de 1857.
De João da Paz conservam-se notas biográficas em três dísticos colocados no seu túmulo. Neles se afirma em resumo que era de nobre estirpe, que viveu inicialmente como eremita numa mata solitária, mas depois, por amor de Deus, voltou à sua cidade natal e aí construiu uma igreja dedicada à Santíssima Trindade e um oratório a São João Evangelista. Nasceu em Pisa, em 1270, mais ou menos. Recebeu o apelido “da Paz” por ter vivido muito tempo num eremitério situado junto de uma porta da cidade chamada “porta da paz”. Teve na juventude uma educação e formação verdadeiramente cristã. Não admira por isso que o seu nome figure entre os primeiros cristãos de Pisa que abraçaram a ordem terceira da penitência, recentemente instituída pelo pobrezinho para santificação dos simples fiéis. Antes de se fazer terceiro franciscano tinha sido soldado da república de Pisa. Entretanto, iluminado pela graça, foi refletindo sobre seu modo de vida militar, que não lhe pareceu consentâneo com o espírito do Evangelho. Por isso decidiu separar-se do mundo e seguir Jesus mais de perto, pelos caminhos da penitência. Contava com 35 anos quando trocou a vida militar pela de terceiro franciscano. Propôs-se reativar “A Pia Casa da Misericórdia”, com o fim de aliviar os sofrimentos dos pobres, dar abrigos a peregrinos e dedicar-se a outras obras de caridade. Mas não se limitou a isso, até porque o seu ideal e a sua grande aspiração era a vida eremítica. Nesse intuito construiu uma cela junto à porta da paz, e aí se dedicou à penitência e a oração, a fim de alcançar de Deus o perdão para as próprias culpas e implorar para os seus compatriotas, frequentemente vítimas de sangrentas lutas, anelada paz. Durante vários anos João fez brilhar a cidade de Pisa com o esplendor das suas virtudes, e o seu nome andava na boca de toda a gente, para quem ele se mostrava sempre afável e carinhoso, desfazendo-se para bem de todos. Deus fez dele pai espiritual de numerosos discípulos que lhe seguiram o exemplo e se vieram a chamar os “eremitas terceiros franciscanos”. Foi a eles que em 1330 o arcebispo de Pisa entregou o eremitério de Santa Maria da Sambuca, que sob a sua direção veio a produzir belos frutos de santidade. Aí deixou João um grupo dos seus eremitas, enquanto ele voltou para o seu oratório da porta da paz, onde passou o resto dos seus dias numa vida mais celestial do que terrena. Ao atingir a idade de 70 anos, consumidos pela vida austera a que se sujeitara, preparou-se para a morte, que o veio acolher como terna irmã, a 13 de novembro de 1340.
                                                                                                                        http://www.reflexoesfranciscanas.com.br/



A utopia de um mundo onde caibam todos os mundos

Vivemos, para todos os efeitos, em um mundo globalizado. E o que se convencionou chamar de “Globalização” é, no fundo, uma construção ideológica do neo-liberalismo a serviço do mercado que se caracteriza por uma tríplice pretensão: onipotência, onipresença e onisciência. Talvez a melhor caracterização que temos da Globalização seja aquela feita com invejável rigor e plasticidade por E. Morin. Segundo ele, estamos navegando rumo a uma era planetária movida por duas hélices. As hélices não remontam propriamente à imagem do avião, mas aos modelos helicoidais do nosso DNA.
A primeira se encontra sob a hegemonia do poder-dominação e é impulsionada por quatro motores: a ciência sujeita à técnica que, por sua vez, é submetida à indústria, que, por sua vez, é subordinada à lógica do lucro. Deste modo, segundo Morin, a nave espacial Terra é colocada em movimento por esses quatro motores interconectados. A segunda distingue-se pela luta pelos direitos da pessoa humana, pelo direito dos povos à soberania, aos ideais de liberdade, igualdade, fraternidade, democracia.
Não resta dúvida que a Globalização em seu estado atual traz em seu próprio bojo uma gama enorme de transformações de tal sorte que se torna cada vez mais legítimo afirmar que o “nosso tempo” se caracteriza por uma “grande transformação”, cujos sintomas são perceptíveis em fenômenos como: a inovação constante, a crise da sociedade salarial, a financeirização do mundo, a sociedade do risco, do controle e do biopoder, o fim do social numa sociedade dita “pós-social”.
Todavia, o principal resultado da Globalização neoliberal e do Imperialismo é, sem dúvida, a pobreza estrutural na qual vive nada menos que 2/3 da inteira população do Planeta. Precisamente aqui, se revela o caráter estruturalmente excludente da Globalização neoliberal. E essa situação de exclusão se agrava ainda mais quando se tem presente que estamos falando da exclusão não só de pessoas e de setores da população, mas de povos e continentes inteiros. Na sua raiz mais profunda, portanto, a globalização econômica provoca assimetria em todas as esferas: economia, política, cultura e também religião.
Temos testemunhado recentemente o despertar de um verdadeiro imperialismo autoritário com discurso e prática fundamentalistas. Usam-se cada vez mais expressões eufemistas como: “império da paz”, “império da liberdade”, “império da democracia”, “império da civilização”, “civilização do Bem contra o reino do mal”, “guerra infinita”. Nesse sentido, o “novo imperialismo” encarna a síntese de todos os fundamentalismos: político, econômico, cultural e religioso. Embora os fiéis guardiães desse imperialismo sejam os Estados Unidos da América com seu potente exército – e isso ficou claro após as invasões do Afeganistão e do Iraque – seus reais detentores são os representantes do capitalismo global. E estes, por sua vez, são apoiados e sustentados pelos mais poderosos organismos internacionais como o Banco Mundial, o FMI, Organização Mundial do Comércio, etc…
O recurso a alguns dados poderá ilustrar melhor essa situação estrutural de exclusão. Em 1960, para cada pessoa considerada rica no mundo havia 30 pobres; hoje, essa situação se radicalizou de maneira brusca, pois, para cada rico, existem hoje 80 pobres no mundo. Dos 6.200 bilhões de habitantes, cerca de 2.852 bilhões de pessoas vivem na pobreza, dentre os quais, 1.200 se encontram na pobreza extrema. Os que vivem, portanto, na pobreza corresponderiam aproximadamente a 46% da população do Planeta.
Só para se ter uma ideia da gravidade do problema: segundo a FAO, a cada dia, morrem 35.000 crianças de fome, isto é, 10 vezes o número de pessoas mortas na destruição do World Trade Center. Na América Latina, a situação é alarmante: 44,4% da inteira população vivem na pobreza e 19,4% na extrema indigência, perfazendo um total de 63,8% de excluídos. O recurso a estes índices e cifras parece altamente esclarecedor na medida em que nos coloca diante do quadro real e estrutural da Globalização neoliberal, pois, na verdade, dos aproximadamente 6 bilhões de habitantes do inteiro Planeta, apenas 1,5 bilhão de pessoas gozam de todos os benesses produzidos pelos sofisticados meios técnico-científicos enquanto que 4,5 bilhões se encontram numa situação de total exclusão.
Tais constatações levam-nos a refletir seriamente sobre os conflitos provocados pela atual dinâmica da sociedade contemporânea. O primeiro deles seria entre a reprodução da humanidade e os destinos do Planeta. Encontramo-nos, para todos os efeitos, encurralados dentro de um beco-sem-saída: de um lado, nossas sociedades têm cada vez mais necessidade da Terra e de seus recursos; de outro, o Planeta suporta cada vez menos nosso crescimento. Não menos grave é o conflito entre a reprodução do capitalismo e da humanidade. A reprodução do capitalismo está cada vez menos relacionada com a reprodução da humanidade, pelo fato do capitalismo se autonomizar cada vez mais da sociedade na qual se encontra inserido.
E, por último, a Terra e as pessoas humanas que nela habitam estão à mercê de uma economia que se impõe como a fatalidade do “nosso tempo”. Trata-se de um acirrado conflito entre a reprodução do capitalismo, incluída naturalmente parte da humanidade ligada a suas atividades e a seus produtos, e a reprodução da Terra com o conjunto de suas criaturas. Numa palavra, as prioridades do capitalismo neo-liberal são radicalmente distintas daquelas orientadas pela ética e pelos valores humanos.
Consciente desta alarmante situação, pergunta-se E. Morin: “Seremos capazes de ir rumo a uma sociedade-mundo portadora do nascimento da própria humanidade? Eis a questão. A humanidade está em formação. Há possibilidade de rechaçar a barbárie e realmente civilizar os humanos? Será possível salvar a humanidade, realizando-a? Nada está definido, nem o pior”. Talvez seja esse, de fato, o grande desafio que nos é lançado em meio à conjuntura atual: a humanidade não está conseguindo mais gerar a humanidade. Nesse caso, a segunda hélice da qual falava Morin precisa ser reforçada pela inteligência e consciência humanas para que a nave espacial Terra não se torne um Titanic.
Toda a reflexão que fizemos até agora desembocará espontaneamente na eleição de uma perspectiva a partir da qual compreender esta complexa realidade e se posicionar coerentemente face à mesma. Como criaturas limitadas que somos devemos renunciar a toda e qualquer pretensão de totalidade. Enquanto tais, nós poderemos, na melhor das hipóteses, ensaiar, quem sabe, achegas distintas à realidade no seu complexo. Tais achegas, contudo, serão sempre parciais e fragmentadas. Nada além de simples clareiras que se abrem a partir de distintas perspectivas parciais. Esse é nosso limite, mas é também nossa chance, possibilidade privilegiada de compreensão da realidade e do conseqüente engajamento responsável em seu complexo tecido.
Além do mais, uma específica parcialidade inerente à fé cristã fica por conta da consciência da imprescindibilidade de se manter a fidelidade à parcialidade evangélica testemunhada por Jesus de Nazaré. Como cristãos somos desafiados a manter aquela sadia solidariedade para com Jesus na sua parcialidade de pregador enviado a anunciar a Boa-nova aos pobres e aos excluídos. A assunção dessa parcialidade evangélica permitirá a nós cristãos ver determinadas coisas que só se vêm a partir da condição na qual eles se encontram. E o que é ainda mais importante: levar-nos-á a uma correção da própria maneira de pensar e de conceber as grandes questões que assolam a grande maioria de nossas populações condenando-as à trágica condição de vítimas indefesas e inocentes.
Talvez hoje, mais do que nunca, os pobres têm sido colocados à margem de nossas relações econômicas, políticas, sociais e culturais a ponto de serem completamente excluídos de toda e qualquer convivência humana e social. Talvez a maior exclusão seja a de sequer prestar ouvidos aos clamores dos pobres por mais vida. Até mesmo seu clamor tem sido hoje silenciado mediante o recurso a tantos expedientes escusos e sofisticados. Chega-se a provar hoje em não poucos ambientes uma resistência ferrenha a sequer mencionar a existência dos pobres. Eles se encontram, de fato, completamente excluídos até de nossas agendas nesse princípio de século. Enquanto cristãos, inseridos na realidade do continente latino-americano neste limiar de século XXI, jamais poderemos ignorar aquela preciosidade que aflorou no coração mesmo de nossas comunidades que é “a opção pelos pobres contra a sua pobreza” como a caracterizou magistralmente o Documento de Puebla, aprofundando assim os sulcos abertos pela Conferência de Medellín.
Diante da gravidade desta situação, qual a posição do Cristianismo que se caracteriza como uma religião com pretensões de universalidade? Tendo presente que as maiores contradições e assimetrias se dão no Terceiro Mundo, onde se encontra 70% dos cristãos, o que teríamos nós cristãos a dizer diante do caráter eminentemente escandaloso desta situação? Qual seria nossa contribuição específica no processo de superação desta exclusão estrutural? Estamos dispostos a fomentar uma globalização não dos interesses do mercado e do capital transnacional, mas da solidariedade e da esperança, da justiça e da paz, dos direitos humanos, sociais e ecológicos? Seria utópico, de nossa parte, engajar-se na construção de um mundo onde caibam todos os mundos?
                                                                                                                                     Frei Sinivaldo Tavares, OFM. 



Santa Isabel, Padroeira da Ordem Terceira


Diz a lenda que Isabel foi invocada mesmo antes de nascer. Um vidente anunciou seu glorioso nascimento como estrela que nasceria na Hungria, passaria a brilhar na Alemanha e se irradiaria para o mundo. Citou-lhe o nome, como filha do rei da Hungria e futura esposa do soberano de Eisenach (Alemanha).
De fato, como previsto, a filha do rei André, da Hungria, e da rainha Gertrudes, nasceu em 1207. O batismo da criança foi uma festa digna de reis. E a criança recebeu o nome de Isabel, que significa repleta de Deus.
Ela encantou o reino e trouxe paz e prosperidade para o governo de seu pai. Desde pequenina se mostrou de fato repleta de Deus pela graça, pela beleza, pelo precoce espírito de oração e pela profunda compaixão para com os sofredores.
Tinha apenas quatro aninhos quando foi levada para a longínqua Alemanha como prometida esposa do príncipe Luís, nascido em 1200, filho de Hermano, soberano da Turíngia. Hermano se orientava pela profecia e desejava assegurar um matrimônio feliz para seu filho.
Dada a sua vida simples, piedosa e desligada das pompas da corte, concluíram que a menina não seria companheira para Luis. E a perseguiam e maltratavam, dentro e fora do palácio.
Luis, porém, era um cristão da fibra do pai. Logo percebeu o grande valor de Isabel. Não se impressionava com a pressão dos príncipes e tratou de casar-se quanto antes. O que aconteceu em 1221.
A Santa não recuava diante de nenhuma obra de caridade, por mais penosas que fossem as situações, e isso em grau heróico! Certa vez, Luis a surpreendeu com o avental repleto de alimentos para os pobres. Ela tentou esconder… Mas ele, delicadamente, insistiu e… milagre! Viu somente rosas brancas e vermelhas, em pleno inverno. Feliz, guardou uma delas.
Sua vida de soberana não era fácil e frequentemente tinha que acompanhar o marido em longas e duras cavalgadas. Além disso, os filhos, Hermano, de 1222; Sofia, de 1224 e Gertrudes, de 1227.
Estava grávida de Gertrudes, quando descobriu que o duque Luis se comprometera com o Imperador Frederico II a seguir para a guerra das Cruzadas para libertar Jerusalém. Nova renúncia duríssima! E mais: antes mesmo de sair da Itália, o duque morre de febre, em 1227! Ela recebe a notícia ao dar à luz a menina.
Quando Luis ainda vivia, ele e Isabel receberam em Eisenach alguns dos primeiros franciscanos a chegar na Alemanha por ordem do próprio São Francisco. Foi-lhes dado um conventinho. Assim, a Santa passou a conhecer o Poverello de Assis e este a ter freqüentes notícias dela. Tornou-se mesmo membro da Família Franciscana, ingressando na Ordem Terceira que Francisco fundara para leigos solteiros e casados. Era, pois, mais que amiga dos frades. Chegou a receber de presente o manto do próprio São Francisco!
Morto o marido, os cunhados tramaram cruéis calúnias contra ela e a expulsaram do castelo de Wartburgo. E de tal forma apavoraram os habitantes da região, que ninguém teve coragem de acolher a pobre, com os pequeninos, em pleno inverno. Duas servas fiéis a acompanharam, Isentrudes e Guda.

De volta ao Palácio quando chegaram os restos mortais de Luís, Isabel passou a morar no castelo, mas vestida simplesmente e de preto, totalmente afastada das festas da corte. Com toda naturalidade, voltou a dedicar-se aos pobres. Todavia, Lá dentro dela o Senhor a chamava para doar-se ainda mais. Mandou construir um conventinho para os franciscanos em Marburgo e lá foi morar com suas servas fiéis. Compreendeu que tinha de resguardar os direitos dos filhos. Com grande dor, confiou os dois mais velhos para a vida da corte. Hermano era o herdeiro legitimo de Luis. A mais novinha foi entregue a um Mosteiro de Contemplativas, e acabou sendo Santa Gertrudes! Assim, livre de tudo e de todos, Isabel e suas companheiras professaram publicamente na Ordem Franciscana Secular e, revestidas de grosseira veste, passaram a viver em comunidade religiosa. O rei André mandou chamá-las, mas ela respondeu que estava de fato feliz. Por ordem do confessor, conservou alguma renda, toda revertida para os pobres e sofredores.

Construiu abrigo para as crianças órfãs, sobretudo defeituosas, como também hospícios para os mais pobres e abandonados. Naquele meio, ela se sentia de fato rainha, mãe, irmã. Isso no mais puro amor a Cristo. No atendimento aos pobres, procurava ser criteriosa. Houve época, ainda no palácio, em que preferia distribuir alimentos para 900 pobres diariamente, em vez de dar-lhes maior quantia mensalmente. É que eles não sabiam administrar. Recomendava sempre que trabalhassem e procurava criar condições para isso. Esforçava-se para que despertassem para a dignidade pessoal, como convém a cristãos. E são inúmeros os seus milagres em favor dos pobres!
De há muito que Isabel, repleta de Deus, era mais do céu do que da terra. A oração a arrebatava cada vez mais. Suas servas atestam que, nos últimos meses de vida, frequentemente uma luz celestial a envolvia. Assim chegou serena e plena de esperança à hora decisiva da passagem para o Pai. Recebeu com grande piedade os sacramentos dos enfermos. Quando seu confessor lhe perguntou se tinha algo a dispor sobre herança, respondeu tranquila: “Minha herança é Jesus Cristo!” E assim nasceu para o céu! Era 17 de novembro de 1231.
Sete anos depois, o Papa Gregório IX, de acordo com o Conselho dos Cardeais, canonizou solenemente Isabel. Foi em Perusa, no mesmo lugar da canonização de São Francisco, a 26 de maio de 1235, Pentecostes. Mais tarde foi declarada Padroeira da Ordem Franciscana Secular.
                                                                  FREI CARMELO SURIAN, O.F.M. 

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